Anúncio falso, prejuízo real. Como resolver a questão?

Na hora de comprar algo, problemas em relação à oferta, quantidade, origem ou até garantias do produto podem ser considerados propaganda enganosa. Entenda

Segundo dados do Procon-DF, em 2024 foram registradas mais de 2.300 reclamações envolvendo propaganda enganosa no Distrito Federal. Os alvos preferenciais? Promoções de eletrodomésticos, planos de internet, cursos on-line e delivery de comida. Outro dado que chama atenção, apontado pela Federação Brasileira de Bancos (Febraban), é o aumento de 40% nas reclamações envolvendo ofertas de empréstimos “sem consulta ao SPC/Serasa”. Muitas vezes, esses anúncios são iscas para capturar dados pessoais dos consumidores e aplicar golpes, o que caracteriza crime, além de infração administrativa.

De acordo com o artigo 37 do Código do Consumidor, propaganda enganosa é aquela que contém informações falsas ou que, mesmo sendo verdadeiras, são apresentadas de forma que levam o consumidor ao erro. Isso vale para o preço, quantidade, origem ou até garantias do produto ou do serviço.

Carlos Menezes, 41 anos, morador de Taguatinga, passou por uma situação frustrante no fim de 2024. Atraído por um anúncio chamativo nas redes sociais, comprou um aspirador-robô que prometia limpar sozinho qualquer tipo de piso. O produto, além de demorar quase dois meses para chegar, não possuía nenhuma das funcionalidades prometidas. “Ele (robô) mais batia nos móveis do que limpava o chão”, reclama Carlos, que tentou contato com a loja, mas não obteve retorno.

Casos como o de Carlos se multiplicam em lojas onde os responsáveis pela divulgação dos produtos aproveitam a visibilidade de grandes plataformas para vender itens, por exemplo, com descrições exageradas. O Procon alerta que, nesses casos, tanto o vendedor quanto a plataforma podem ser responsabilizados de forma solidária, conforme o artigo 18 do Código de Defesa do Consumidor.

O Procon-DF orienta que os compradores guardem prints, anúncios, e-mails e qualquer tipo de comprovação do que foi prometido, para servir como provas em caso de uma possível denúncia. Além do Procon, o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) também atua em casos de propaganda enganosa, especialmente quando há indícios de que a prática é recorrente e atinge um grande número de consumidores. 

As denúncias podem ser feitas por meio do site do Procon (procon.df.gov.br/) ou, presencialmente, nas unidades de atendimento. Plataformas como Reclame Aqui têm ajudado a expor práticas questionáveis e pressionar empresas a resolverem pendências. É importante destacar que não só grandes empresas cometem esse tipo de infração. Pequenos comércios locais, principalmente em datas como Black Friday, Páscoa ou Natal, também são autuados por prometerem descontos que não existem ou produtos que não correspondem ao que foi anunciado.

Outro ponto de atenção é o uso de inteligência artificial em anúncios, pois empresas estão criando imagens hiper-realistas de produtos que não existem fisicamente, ou que têm qualidade muito inferior ao que é apresentado. Em muitos casos, o consumidor só descobre o engano depois de pagar e, pior, em sites sem CNPJ ou com sedes no exterior, dificultando a responsabilização. O Procon recomenda verificar sempre se a empresa tem CNPJ válido, se há política de troca e devolução, e se o site possui canais de atendimento ao consumidor.

Indução ao erro

Segundo Jéssica Vieira, especialista em direito do consumidor, a publicidade enganosa ocorre quando traz informações falsas ou, mesmo que verdadeiras, capazes de induzir o consumidor ao erro sobre aspectos relevantes do produto ou serviço, como qualidade, preço, origem ou quantidade. “Sua ilicitude é objetiva, ou seja, independe da intenção do fornecedor. Basta que tenha potencial de enganar o consumidor”, explica. Ela acrescenta que a omissão de dados essenciais também pode configurar propaganda enganosa, uma vez que viola o princípio da boa-fé objetiva e o dever de informação.

No cotidiano, Jéssica observa diversos tipos recorrentes dessa prática. Entre os mais comuns estão ofertas com preços irreais, que não correspondem ao valor final, promessas de benefícios exagerados, uso de expressões ambíguas e comparações indevidas com concorrentes. “Também é frequente vermos promoções com estoque insuficiente e imagens que não condizem com o produto entregue”, afirma a especialista, destacando que essas práticas comprometem a relação de confiança entre consumidor e fornecedor.

Uma dúvida comum é se a expressão “imagem meramente ilustrativa” exime o fornecedor de responsabilidade. Para Jéssica, a resposta é clara: não. “Se a imagem for capaz de induzir ao erro sobre características essenciais do produto, como tamanho, cor ou funcionalidades, essa ressalva não tem efeito. O fornecedor continua responsável por garantir clareza e transparência na publicidade”, afirma.

Cuidados

Para evitar armadilhas, Jéssica recomenda uma série de cuidados antes de realizar uma compra, especialmente em ambiente digital. Verificar a reputação da loja, ler atentamente a descrição dos produtos, consultar avaliações de outros compradores e salvar registros da oferta são medidas básicas. “Desconfie de preços muito abaixo do mercado e veja se o site tem CNPJ, política de devolução e canais de atendimento acessíveis”, orienta.

As penalidades para quem faz propaganda enganosa variam de acordo com a gravidade do caso. Segundo a especialista, a legislação prevê desde sanções administrativas — como multas, suspensão da atividade e cassação de licença — até responsabilidades civil e criminal. “O artigo 67 do CDC prevê detenção de três meses a um ano e multa para quem fizer publicidade enganosa ou abusiva”, destaca.

Sobre a diferença de tratamento entre grandes empresas e pequenos comerciantes, Jéssica explica que “não importa o tamanho do fornecedor. A lei protege todos da mesma forma, e a responsabilidade pela publicidade enganosa é objetiva. Todos devem seguir as mesmas regras de clareza e veracidade”.

Mesmo com a fiscalização sendo realizada pelo Procon-DF, a reincidência das infrações indica que muitas empresas preferem arriscar e pagar possíveis multas a mudar suas práticas incorretas. Campanhas de conscientização têm sido vistas como uma forma eficaz de prevenir o problema. Neste ano, o Procon-DF lançou o projeto Publicidade Consciente nas Escolas, que ensina jovens a identificar anúncios enganosos e conhecer seus direitos desde cedo.

(fonte: Correio Brasiliense)

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